quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Blog de Lingua Portuguesa

Queridos e queridas,

A Profa. Eleandra Lelli criou um blog para divulgar textos e discussões a respeito da Lingua Portuguesa. Confiram!

http://blogdaprofessoraeleandralelli.blogspot.com/

Utopia da educação 7

Utopia da Educação
Lauber Machado


A Utopia é a teoria de um estado perfeito, onde todos vivem em harmonia e trabalham pelo bem comum. Essa ilha imaginaria foi relata por Thomas Morus no século XVI e até hoje ainda se busca o modelo de sociedade ideal.

Como seria a Utopia da Educação, o modelo ideal que atinja todas as expectativas esperadas na educação, no ensino escolar, levando em consideração o modelo de sociedade que temos hoje. Vou relatar como seria uma instituição de ensino que atingi todos os níveis educacionais esperados por nossa sociedade.

A Felix
Felix (significa feliz em Latim), é uma instituição de ensino publica onde todos são responsáveis pela sua conservação.

Na Felix a parte administrativa trabalha junto com a pedagógica, onde não existe hierarquia, a forma de gestão predominada é a horizontalidade. Ela tem maior autonomia com formas de administrar mais flexíveis onde o professor também é um gestor no processo educativo. Ela tem a autoridade com base na competência de todo os envolvidos na gestão da escola antes que pela lei, com isso os seus interesses não ficam barrados em questões burocráticas.

O professor na Felix não é um simples transmissor de conhecimento, ele é um produtor de conhecimento ou um mediador dele, ele aprende junto com o aluno, buscando o seu desenvolvimento. Mas ele não trabalha isoladamente, sempre procura discutir com seus colegas de profissão para que juntos busquem soluções para os problemas comuns.

A Felix é uma organização construída socialmente, é aberta para o mundo exterior mantendo uma relação com a sociedade para resolver problemas comuns entre todos, onde as decisões não se separam, ficam no mesmo nível. Dessa maneira consegue fazer com os pais dos alunos fiquem sabendo do desenvolvimento dos seus filhos. Os pais vão sempre a escola conversar com os professores, ver se existe alguma dificuldade que possa ser resolvida por eles. Mas o papel dos pais começa mesmo antes dos filhos terem idade suficiente para entrar na Felix, ainda crianças os filhos já recebem apoio dos pais, com leituras e programas culturais. A Felix disponibiliza livros infantis que são de toda a sociedade e quem pega um livro tem um prazo para devolver, e deve devolver no mesmo estado que pegou, ao contrario terá que pagar pelo dano, e esse dinheiro é destinado na compra de mais livros. Foi uma formar eficiente que a Felix encontrou de conservar melhor seus livros e ampliar sua biblioteca, com isso, é sempre alto o desempenho dos alunos da Felix.

A Felix sempre busca formar cidadãos ativos, com consciência social, com habilidades cognitivas para pesquisar, escolher, desenvolver idéias próprias etc. Alem de tudo ela prepara o aluno para o mercado de trabalho com capacidade de ajustar-se a novas situações. Nela tem pessoas te todos os tipos, tanto social como cultural, com isso ela não padroniza as atividades, pelo contrario, ela incentiva o trabalho em equipe promovendo oportunidades variadas.

Esse bom desenvolvimento dos alunos esta ligado ao professor, a Felix da um grande suporte aos professores e os alunos só aprendem bem com professores que aprendem bem, porque sem ele não é possível fazer nenhuma inovação nessa instituição, tudo que a Felix faz passa pelo professor. Dessa maneira o professor da aula daquilo que produz não daquilo que copiou, porque quem não pesquisa não tem nada para ensinar. Com isso os professores são valorizados, podem contar com a instituição no momento que precisarem, são verdadeiros pesquisadores.

Todos os envolvidos na gestão e administração educacional da Felix dividem responsabilidades, conjugam esforços, criam condições favoráveis nos procedimentos educacionais, através de planejamentos, avaliando constantemente as ações desenvolvidas, buscando melhoria por toda a instituição.

O resultado disso é uma sociedade mais humana, que se importaria com o próximo, mais justa, sem individualismo, todos trabalhariam pensando no próximo, porque só se consegue o bem que faz o bem.

Utopia da educação 6

Queridos e queridas,




Das Terras de Paideia
Priscila Miranda Caetano

Um dia levantei sedento de novas aventuras, sempre fui peregrino, nunca tive casa minha, nem nunca me apeguei a nada desta vida. Sempre olhei o mundo ao meu redor e nunca me conformei com a desigualdade, ricos cada vez mais ricos, pobres cada vez mais pobres, o egoísmo humano alcançando níveis inimagináveis, cada um se preocupa apenas consigo mesmo e com seus próprios interesses, decidi me afastar de tudo, resolvi me isolar do mundo.

Cheguei ao porto de Santa Luzia e logo avistei um barco velho, todo desgastado, mas algo de muito especial senti naquela modesta embarcação, curioso comecei a me aproximar e logo veio ao meu encontro um homem de barbas cumpridas, semblante cansado, mãos e pés calejados, mas com um belo sorriso no rosto.

- Posso ajudá-lo?

Atônito com a estranha alegria do velho mal consegui pronunciar palavra e ele continuou...

- Por que estás tão assustado? Tenho boas novas para você. Já o esperava, nossos destinos estão ligados, temos uma longa jornada pela frente, entre logo precisamos partir...

Confesso que a primeira vista acabara de encontrar o sujeito mais maluco que já cheguei a conhecer, mas a sua loucura me pareceu tão convicta e racional que sem pensar entrei...

Começamos a navegar e enfim consegui dizer minhas primeiras palavras...

- Para onde estamos indo?

- Pensei que não me perguntaria nunca! Exclamou o velho homem... Estás à procura de aventura? Pois terás a sua aventura... Estamos indo a uma terra nunca antes conhecida, tão distante quando o final de tudo... Uma ilha de beleza incomparável e habitantes interessantíssimos.

Depois de meses de viagem, finalmente avistamos a ilha, ao nos aproximarmos muitas pessoas vieram à praia nos receber. A Ilha se chamava Paideia, era realmente fascinante a beleza do lugar, mas o que mais me impressionou foi a calorosa recepção.

Ao chegarmos à cidade chamada Das Cachoeiras, fomos levados até o prefeito, que prontamente nos recebeu. Descobri então que o velho do barco era um paideiense, o prefeito o cumprimentou com muito respeito e pediu-lhe que apresentasse a sua visita.

- Este é o homem escolhido pelo destino para contar ao mundo nossa história, enfim o encontrei!

- Que notícia maravilhosa! Exclamou o prefeito em grande vibração...

- De que destino falas? Que história é esta?

- Calma meu jovem... Terás muito tempo para descobrir este lugar! Respondeu-me o prefeito com um enorme sorriso...

Saindo da prefeitura, comecei a passear pela praça da cidade, avistei logo um grande parque com muitas crianças brincando e espaço muito amplo onde os jovens praticavam todos os tipos de esportes.

O velho então me contou que aquele era o horário de lazer para os habitantes da cidade, o fim de semana era sagrado para eles, descansavam e procuravam praticar esportes, pois o corpo era considerado o bem material maior. Ninguém trabalhava mais do que era necessário, todos viviam muito bem.

Quando o indaguei sobre a tal história que a pouco falara, história que já despertava minha curiosidade de uma maneira muito forte.

O velho começou então a falar...

- Há três décadas, Paideia vivia em caos total, os políticos corruptos se proliferaram no poder, instruídos por um único homem, que chegou a Paideia com boa oratória e grande carisma, conquistando a todos com suas palavras. Descobrimos tarde demais que eram palavras vazias, jogadas ao vento, sem nenhuma verdade ou lealdade. Desenvolveram um sistema político de fachadas e manipulações, nomeando ministros preocupados apenas com seus cargos e o quanto poderiam ganhar com eles. Entre estes ministros, o pior de todos foi o da Educação, ele instituiu nas escolas um sistema de gestão e metodologia ditatoriais e totalmente sem base educativa. Diminuíram o salário dos professores, diretores e funcionários, atando-lhes as mãos com conteúdos prontos e os proibindo-lhes de sair do “programa” instituído por estes homens. Isto para nós significou a grande ruína, sempre aprendemos que o conhecimento é poder, que o conhecimento é liberdade, o produto de tudo isto foi enfraquecimento e escravidão.

A alienação tomou conta das pessoas, que para sobreviverem trabalhavam muito e ganhavam pouco, os mais desafortunados nem trabalhar conseguiam e a nossa sociedade mergulhou na fome e na miséria.

As faculdades eram apenas para os ricos que descendiam ou tinham alguma ligação com a política. As vagas públicas foram restringidas por meio de processos seletivos de nivelamento muito acima do que ofereciam nas escolas, assim somente os que tinham educação particular na maioria das vezes ocupavam as vagas. Nosso povo era destruído aos poucos, recebiam migalhas e não conseguiam exercer com valor a democracia que naquele momento tinha sentido oposto, significava prisão.

- Mas o que aconteceu? Como superaram essa realidade? Perguntei ansioso...

- Nenhuma mudança acontece se as pessoas não reagirem, dizem que as grandes revoluções partiram de iniciativa estudantil... Alguns jovens pobres freqüentadores dessas escolas resolveram se manifestar, liderados por um homem de trinta anos chamado Petter. Uma grande comitiva saiu às ruas para protestar, pararam seus afazeres e começaram a discursar nas praças, a chamar a população para refletirem sobre sua realidade, para unirem-se e exercerem com competência seu direito a democracia e a liberdade. A popularidade desse grupo tanto cresceu que nas eleições seguintes, lançaram Petter candidato, sua vitória foi esmagadora e novamente a população saiu pelas ruas agora para levá-lo até a prefeitura e ver sua posse.

- Mas depois que se apossou do cargo não se acomodou também? Perguntei desconfiado...

- Muito pelo contrário, a primeira coisa que fez foi acabar com o sistema de conteúdos prontos e padronizados nas escolas. A segunda foi aumentar significativamente os salários de todos os membros da escola, valorizando a profissão de professor como deve ser valorizada, já que ensinar é tarefa acima de tudo nobre. Motivando assim os funcionários e eliminando os acomodados que não tinham compromisso com a educação de qualidade. A terceira e não menos importante foi promover um grande evento para reunir os alunos e os que tinham se afastado da escola para a inauguração do Dia do Saber, data que se tornou feriado nacional, comemorado todos os anos com muita festa e atividades educativas de todas as espécies. Neste grande evento, muitos mestres de todos os campos de conhecimento palestraram sobre temas universais, sobre conceitos que todos a partir daquela data deveriam adotar, estavam todos finalmente livres!

Depois daquela data histórica, passamos a viver de fato a liberdade que ansiávamos e pela qual lutamos bravamente. Nas escolas, os professores usavam de diversos métodos para trazer à realidade de seus alunos todos os conteúdos que aprendiam, passaram a promover fóruns de debates sobre política, economia, ciência, meio ambiente etc. Todos tinham direitos iguais e eram motivados a desenvolver seu pensamento crítico, a pensar na sociedade em que estavam inseridos e o que poderiam fazer para melhorá-la sempre.

Todos passaram a conhecer a si mesmos e a suas realidades, conquistaram o poder de pensar, de saber e de ansiar por conhecer mais, por aprender com tudo o que estava ao seu redor.

A partir desta data, os lazeres voltaram para o cotidiano das pessoas, aos finais de semana todos procuramos praticar esportes, freqüentamos também teatros, cinemas e shows, que estão ao alcance de todos.

Quando a semana começa, o estudo é a primeiro dever e o maior dos direitos, o tempo de estudo e trabalho são balanceados de maneira a ressaltar a importância de ambos, ninguém trabalha por um tempo que o faça se cansar para os estudos e ninguém estuda por tempo exagerado que o faça sedentário. Muitos cidadãos que tinham abandonado a escola por motivos diversos, depois disto voltaram para as escolas e eram incentivados a conhecer, eram ensinados que o conhecimento os tornava livres e prósperos, que os capacitava para trabalhar e para viver com qualidade e mudar seus próprios destinos.

- Que incrível... Suspirei emocionado...

Depois de ouvir esta história e de passar alguns maravilhosos meses em Paideia, estou agora a escrever não simplesmente sobre o que os meus ouvidos ouviram daquele modesto senhor, mas relato-vos o que contemplei, tive a certeza que a maior realização de um povo é a Educação, passei dias inteiros refletindo sobre o porquê “minha terra” também não pode experimentar essa revolução, abrindo suas mentes para viverem a vida plenamente, o homem existe para pensar, isto o diferencia do resto dos animais, fomos criados para mudar o mundo, fomos criados para crescermos e atingirmos nossos ideais.

O conhecimento é poder, precisei ir longe para enxergar o resultado disto, numa sociedade onde o saber é valorizado, onde o expressar-se é direito de todos, onde a manipulação não cega as pessoas, onde a democracia funciona, onde todos têm a visão da posição que podem atingir e o que precisam fazer para isso, num lugar onde a acomodação não é proliferada, onde os “panos quentes” são tirados, onde o ensinar e o aprender são valorizados, onde não há conformismo, onde há esperança de um futuro diferente, onde existe ideal e luta, neste lugar há liberdade, há plenitude, há homens e mulheres que encontraram sua verdadeira essência, seu verdadeiro sentido de viver, sua real identidade.

Das terras de Paideia voltei para mudar, trazer até o maior número de pessoas o verdadeiro conceito de Educação, de conhecer a si e ao mundo, de encontrar um sentido para sua própria existência, de lutar por seus direitos e cumprir seus deveres, de abandonar a visão de que não existe mais solução para a “coisa”, de que tudo é perdido. A Educação transforma, o conhecimento é liberdade e o pensar é o caminho! Esta é minha missão...

Utopia da educação 5

TUDO PODE MUDAR, BASTA QUERER!

Elisabete

Tudo começou em uma linda manhã de segunda-feira.

Lá estava eu, uma garotinha desengonçada, de 11 anos, acordando com o som do meu despertador, eram seis e meia da manhã.

Não acreditei que a noite tivesse passado tão rápido. Veio a mente Dona Enriqueta, logo ela na primeira aula desta segunda-feira. Dona Enriqueta era bem velhinha, com óculos fundo de garrafa, quase ceda coitada, com um birote enorme em sua cabeça branca, muito chata, desatualizada, desde que a conheci na 4ª série ela insiste em dar o mesmo conteúdo, só que agora já estou na 6ª série e continuo vendo “oxítona, paroxítona, proparoxítona, ditongo, hiato...”, e nem se quer nos passou as mudanças ortográficas que foram implantadas no início do ano...

Não bastando a chatice de suas aula, sua tirania era total, nem os mosquitos se atreviam a entrar na sala, o silêncio era total, parecia até que ouvia nossa respiração.

Na hora do intervalo era outra tortura, crianças se espancando, xingando-se, correndo, derrubando nossos lanches, nos empurrando, eu odiava, me escondia em um cantinho bem escondido atrás do ginásio para comer e não ser perturbada.

Nesta escola não há organização, na secretaria ninguém informa nada, pois sabem menos que nós.

Os muros, paredes, portas e janelas, já faz tempo que não vêem um tinta, os portões de entrada todos enferrujados e mau fecham direito, possibilitando a fuga dos mais levados por entre as frechas.

Organizando meu material, lembrei-me que no segundo período terei aula de geografia com o professor Adolfo, um pobre coitado, embora carregue diversos diplomas nas melhores universidades do país, ninguém o respeita, isto porque ele é muito “bonzinho”, todos o satirizam fazendo a continência de nazismo, (“Adolf Hitler”), ele não entendia nada e ainda acha engraçado.

É impossível fazer anotações em sua alma, todos conversando, rindo, jogando papeizinhos e giz uns nos outros, mesmo para nós que sentamos nas primeiras carteiras.

Acabei de arrumar minha mochila e fui à escola, com uma vontade enorme de sumir, mas não podia, meus pais me matariam, com certeza ficaria um bom tempo de castigo...

Distraída com meus pensamentos, tropiquei em uma raiz enorme que havia trincado a calçada. Segui-a com os olhos para saber a qual das árvores pertencera tão grande raiz.

Não demorou muito, logo a avistei, ela era linda, gigantesca, sua copa sumia entre as nuvens.

Senti-me atraída por aquele ser tão exuberante, fui direito ao seu encontro.

Quando fiquei embaixo da árvore, meus olhos não acreditavam no que viam, era muito mais bela, suas folhas e flores tinham cores muito vivas, seu tronco era muito grosso, tentei abraçá-la com meus braços tão pequeninos, mas para poder completar a circunferências, precisaria de mais uns 15 pares de braços.

Ao encostar o meu rosto em seu tronco, ouvi barulhos, vozes, risadas e percebi que viam de dentro da árvore, bati no tronco e percebi que este era oco, comecei a circular à procura de uma entrada, mas parecia que nunca conseguiria completar toda a volta, quando notei um sensível relevo no tronco, a cor era diferente do resta, tinha o formato de uma pomba com asas enormes, me encantei e não pude me conter, fui em busca daquela figura magnífica.

Coloquei umas pedras no chão para poder alcançá-la, finalmente quando consegui, uma frecha se abriu, uma luz muito forte que me cegou e algo me puxou com muita força, senti meus cabelos voando, um vento frio em meu rosto, senti a ponto de meu nariz congelar, parecia estar voando, mas com uma velocidade inexplicável, meu coração batia acelerado, não sabia o que estava acontecendo.

Subitamente caí de costas em algo macio, abri os olhos e me deslumbrei com a beleza que estava ao meu redor.

O céu azul cheio de pássaros coloridos, um sol maravilhoso, muitas árvores e comecei a sentir um perfume maravilhoso que vinha do jardim de flores que haviam amortecido a minha queda.

Havia flores de todos os tipos, cores e tamanhos, me levantei, recolhi os meus livros e cadernos e olhei para todos os lados para descobrir aonde eu poderia estar para encontrar o caminho de volta para a escola.

Mas para meu desespero e angústia, não conhecia nada, estava ficando com medo, quando comecei a ouvir vozes de crianças, segui aquele som e cheguei a uma trilha, logo adiante avistei um grupo de meninas e meninos com uniforme de escola, com cadernos e livros nas mãos.

Corri para alcançá-los, quando estava a poucos metros chamei-os, eles viraram para trás e vieram ao meu encontro. Achei estranho, pois parecia que me conheciam, e me conheciam mesmo, isso porque uma das meninas chamou-me pelo nome.

- Belinha, onde estava, achávamos que não iria à escola, apresse-se estamos atrasados! O sinal irá tocar em alguns minutos. E puxou-me pelo braço, sem entender nada, me deixei levar, no final da trilha lá estava, uma espécie de prédio com características de casarão, enorme, com cores azul, branco e detalhes em relevo de livros, de lápis, de borrachas por todas as paredes, não havia pichações, tudo muito bem conservado.

Na frente do prédio havia um jardim muito florido, cheio de borboletas e beija-flores, entre os jardins haviam vários caminho, onde ficavam algumas mesas cobertas com vários estudantes com livros lendo e fazendo lição, estudando em grupo.

Do lado esquerdo do prédio havia quatro quadras, que eram utilizadas para a prática de vários esportes, basquete, vôlei, tênis, futebol, atletismo..., do lado direito duas piscinas, uma para os pequeninos e iniciantes na prática de natação e a outra para os maiores onde faziam competições, elas tinham o formato da figura da árvore, ou seja, de pombas com asas enormes.

Nos fundo avistei um galpão enorme, parecia uma fábrica, alguns alunos mais velhos saiam e entravam por uma porta bem grande, todos de uniforme cinza, com sapatos pretos, óculos de proteção e capacete.

Fiquei curiosa e não hesitei e perguntei se não poderíamos entrar naquela fábrica. Todos me olharam estranhamente e disseram:

- O que você bebeu no café da manhã, Belinha? E você não sabe o que é?... São as oficinas profissionalizantes para os alunos do colégio, ainda temos muito chão antes de podermos estudar lá, temos que nos contentar com nossas matérias básicas....

O sinal tocou, todos se dirigiam calmamente para a porta de entrada, não entendia nada, principalmente a empolgação, não só dos meus “novos/velhos” amiguinhos, mas de todos os alunos.

Não podia acreditar! Como podiam gostar de ir à escola?

Cheguei a frente do prédio, me dirigi para o portão de madeira maciça que ficava na entrada, todo trabalhado, fiquei encantada com seu tamanho, era enorme, ao atravessá-lo acessei o corredor principal, foi quando comecei a entender, tudo muito limpo e cheiroso, organizado, não haviam crianças gritando, se espancando, correndo, mau educados, pelo contrário, todos conversando, brincando uns com os outros, andando isso mesmo andando e entrando de forma organizada em suas salas.

No final do corredor havia uma senhora muito distinta, elegante, simpática, os pequeninos do primário iam na sua direção para abraçá-la e beijá-la, me encantei com seu sorriso e seus lindos olhos azuis, que nos olhavam com muita ternura, parecia até um anjo.

Uma das meninas, a Ana, que encontrei na trilha, me puxou o cabelo e me indicou a sala para entrar e me “lembrou” que aquela senhora era a diretora, Senhora Clara.

Ao entrar na sala não acreditei, carteiras arrumadas em filas, muito bem conservadas pareciam recém compradas, limpinhas, a sala cheirava gostoso, tudo limpinho.

Sentei ao lado de Ana, fiquei sabendo que a aula seria de Língua Portuguesa, não acreditei, já me veio na mente a tal da Dona Enriqueta e a tal “oxítona, paroxítona...”, mas para minha surpresa a professora da matéria era uma jovem mulher, seu nome era Beatriz, parecia ter uns 40 anos mais ou menos, estava com um vestido colorido, era bonita e muito sorridente, cumprimentou a sala, sentou-se e começou a fazer a chamada, e estranhamente meu nome estava na lista e a professora me conhecia.

Terminada a chamada, a professora Beatriz começou a passar a matéria na lousa, não acreditei, finalmente análise sintática, comecei a ri sozinha, todos me olhavam sem entender nada.

Como Dona Enriqueta não ensinava nada, comecei a estudar sozinha, mas como toda matéria nova, tinha muitas dificuldades, principalmente em análise, fiquei tão feliz, pois agora sim conseguiria entender.

Dona Beatriz era muito gentil e paciente, ensinava todos da mesma forma, e tirava dúvidas daqueles que a questionavam.

Fiquei encantada com a aula e a professora. Ah!!... bem que ela poderia ficar no lugar da Dona Enriqueta!!!!!

Quando soou o sinal do intervalo, não quis sair da sala, Ana insistiu tanto que concordei e a acompanhei, mas já estava esperando para o pior, crianças gritando, caindo, se matando.

E, mais uma vez fui surpreendida, as crianças estavam brincando no ginásio, rindo, se divertindo, os grandes cuidando dos menores, ensinando regras de jogos.

No refeitório, tudo muito organizado, as tia da cozinha com luvas e tocas na cabeça serviam aos alunos, Na parede o cardápio com os dias da semana, nas segundas:arroz, feijão, salada de batata com ovos e frango assado; nas terças: macarronada com molho bolonhesa com almôndegas; nas quartas: arroz, feijão, bife com batata frita; nas quintas: arroz, peixe em molho com purê de batata; e as sextas: sopas, ás vezes de palmito, legumes, canja, de feijão.(todas as refeições acompanhavam salada de alface, tomate, sucos naturais, e sobremesas, gelatina, creme de chocolate, pudim, sagu, arroz doce, canjica)

Não acreditei, na minha escola só tínhamos chocolate com três bolachas de maizena.

Após o intervalo fomos para o segundo período, a matéria era geografia, coincidência demais!!!

Quando entramos na sala, o professor já encontrava-se na sala, com um globo em cima da mesa,seu nome era Pacífico muito sério, de óculos, meio calvo, gordinho, de descendência oriental, parecia bravo, nos cumprimentou e nos sentamos. Com o sinal de início do período começou a fazer a chamada, todos em silêncio iam respondendo “presente senhor”.

O senhor Pacífico abriu o livro de mapas e começou a nos explicar sobre as demarcações dos territórios, dos países que estavam em conflito, Iran, Iraque, Golfo Pérsico, Kuait, os motivos da guerra, o número de mortos, as destruições das cidades. Explicou-nos que muitos dos conflitos naquela região eram por diversos motivos entre eles a religião, a política, a economia, os poços de petróleo, a disputa pelo controle do poder.

Mostrou-nos um vídeo de crianças que viviam nestes países e fiquei chocada com o que vi, algumas haviam perdido os pais, irmãos, parte de seu corpo, mas o que mais me tocou foi que todos tinham um sorriso enorme em seu rosto, mesmo com tantos problemas, catástrofes, eles se mostravam fortes, com livros nas mãos, com força de vontade de enfrentar todo o caos para chegar a uma pequena sala, sem cadeiras, sem mesa, sem nada, simplesmente se sentavam no chão para ouvir os ensinamentos da professora.

Ao término do vídeo fiquei muito triste comigo, pois embora minha escola não fosse bem o modelo que gostaria, eu tinha uma sala de aula, cadeiras, mesas, professores.

Nos minutos finais estava pensativa, se não estava feliz com minha escola, se não concordava como era administrada, deveria lutar pela mudança.

Saí da escola com meus pensamentos fervendo, comecei a listar as prioridades a serem reivindicadas, utilizaria como base essa escola o qual gostei tanto, se ela pode ser assim, vou fazer de tudo para que a minha também o seja, quando de repente caí em uma poça de lama, que se abriu abaixo dos meus pés e lá estava eu novamente,voando rapidamente através de uma luz muito forte, caí, senti uma enorme dor no tornozelo, quando abri os olhos lá estava eu no chão, havia tropicado naquela raiz, não acreditei, havia voltado no tempo, olhei o relógio faltavam alguns minutos para o sinal.

Corri, consegui chegar a tempo para a aula da Dona Enriqueta, e não é que a aula que ela havia preparado era sobre as mudanças ortográficas!!!!Não acreditei e Pensei essa escola tem jeito, só basta querermos!!!

FIM

Arte, tradição e modernidade

Queridos e queridas,


Reproduzo aqui texto escrito por Gilmar de Carvalho Para o Diário do Nordeste, de Fortaleza, em 24 de janeiro deste ano.

Como sempre, ele nos possibilita boas reflexões.

O pesquisador Gilmar de Carvalho realiza uma análise das relações da arte com a tradição, a partir de suas conexões com a mídia e as novas tecnologias

Um ponto de partida para se pensar a relação da arte com a tradição é analisar suas relações com a mídia e com as novas tecnologias, num contexto de valorização do mercado.

Tradições podem ser pensadas como as práticas de longa duração. Isso não significa que se mantenham à margem das modificações provocadas pela dinâmica da cultura. Pelo contrário, constituem a parte menos vulnerável à tensão das transformações sociais, às mudanças provocadas pelos novos padrões de comportamento, pelas questões de mercado, e pelo impacto das novas mídias e tecnologias.

Observar e acompanhar essas mudanças pode ser um exercício criativo e complicado nos dias em que vivemos.

De certo modo, a tradição vive um impasse: pode ser vista como anacrônica ou conservadora, por muitos, e é compreendida como fator de sedimentação social por outros.

Sem juízos de valor, preconceitos ou sem obedecer ao senso comum, vale menos o que se pode deduzir e mais a oportunidade desta discussão na contemporaneidade.

Partamos do pressuposto de que a tradição não se fecha às influências recebidas, cada vez maiores e de maior impacto sobre crenças, valores, manifestações, saberes, ofícios, celebrações, o que a Unesco achou por bem delimitar como o campo do "patrimônio imaterial".

Um importante teórico da Semiótica da Cultura, o ucraniano Iuri Lotman (1922 - 1983), afirmou que "toda obra de arte inovadora é elaborada com um material tradicional".

Vale ir adiante e pensar as relações da tradição com a mídia e o mercado, com todas as implicações possíveis no campo da economia, da antropologia e da comunicação.

Mídia

A mídia há muito deixou de ser um conjunto de aparatos tecnológicos com a finalidade de difundir mensagens. Esta seria apenas uma de suas funções, talvez a mais evidente e a menos importante.

Pode-se pensar a mídia como o lugar central ou nodal onde a sociedade se pensa e onde decisões são tomadas. Considere-se aqui o campo fértil das ideologias, a explosão demográfica, o processo de urbanização e a facilitação de equipamentos como rádios, televisores, computadores, "smartphones", câmeras digitais, mp3, e teremos uma babel de imagens, sons e material informativo que cria novas teias e novas redes de usuários e produtores, tornando viável a aldeia global antecipada por McLuhan.

Impossível pensar a sociedade atual sem o primado das mídias e sem as tecnologias de ponta que avançam, inexoravelmente, numa velocidade que nos deixa atônitos diante das reações que provocam e das situações com as quais nos deparamos.

É tudo muito novo, sem a ancoragem de grandes teóricos, numa abordagem multidisciplinar, onde vamos beber na fonte dos filósofos, dos sociólogos, dos antropólogos e dos semioticistas, com a inserção social de muitas tribos, novos públicos e a consequente ampliação do mercado.

No caso brasileiro, esta passagem é muitas vezes mais abrupta, quando segmentos marginalizados, com pouco acesso à palavra impressa, são jogados para o universo virtual, sem escalas e sem uma preparação para a aceitação de novos parâmetros.

Certo é que muitas situações são irreversíveis e não adianta lamentar, de modo reacionário, o avanço das tecnologias e das mídias, numa visão mais apocalíptica ou, de outro lado, também não vale festejar esse acesso como conquista ou como panaceia, como pretendem os mais integrados, na visão lúcida de Umberto Eco.

Temos situações curiosas que nos levam a reflexões mais densas nesse campo que envolve vida, cotidiano, arte e trabalho.

Pode-se partir do pressuposto de que as manifestações que fazem sentido para as comunidades continuarão sendo praticadas, ainda que com fortes mudanças.

Em meio aos "iluminismos" de toda ordem, interferências do mercado, da mídia e do impacto das tecnologias, fica difícil manter um ritmo de produção que satisfaça as expectativa de consumidores ávidos por novidades e que atenda ao ritmo de vida, de possibilidades e de superação dos artistas das camadas subalternas, perplexos, como todos nós, diante do frenesi contemporâneo de novas tendências, de superação do costumeiro e de manutenção da "aura" num contexto que se propõe serial, ainda que com as marcas sofridas de seus autores.

Apropriação

A ideia da tradição artesanal como ponto de partida para a criação ou releitura nas artes plásticas começa a dar sinais de vigor com o fim do academicismo. O desmoronamento do cânone e a falência de um modelo que dava evidentes sinais de desgastes, depois da fotografia, do cinema e de outras técnicas, fez chegar os ideais modernos, ainda que muitas vezes fora de tempo.

O modernismo brasileiro trouxe vislumbres do que seria uma "ingenuidade" caipira nas cores e em certa temática de Tarsila do Amaral.

No caso cearense, de modo mais tardio, estes referenciais só entram muito depois, porque esta apropriação da tradição e as bases do que seria uma cultura brasileira, com a valorização do barroco mineiro, da figura de Aleijadinho, e do conceito de miscigenação vai se reforçar com as viagens de Mário de Andrade, com o ideal antropofágico e explode com o Tropicalismo.

Vamos encontrar no jornal literário "José" xilogravuras de Aldemir Martins e Barboza Leite. Sérvulo Esmeraldo corria por fora, aqui, em São Paulo, e em Paris, cortando gravuras, levando o trabalho de Noza e se reforçando como o grande artista que é. Zenon Barreto pintou uma moça que virou cachorra, com visível influência das capas dos folhetos de feira e recorreu a quengas de coco, bilros, e outros materiais menos nobres para fazer esculturas que equivaleriam a uma versão politizada de nossa "pop art".

José Tarcísio vai dar o salto em grande estilo. Adérson Medeiros, com a apropriação dos ex-votos, escreve um capítulo importante das artes no Ceará. A parceria de Mariza Viana com Stênio Diniz ainda hoje rende frutos.

Mas não se trata apenas de colocar a tradição como "motivo" ou recorrer ao que fazem as camadas subalternas para se ter cor local. O modismo e o episódico não se sustentam no campo da arte que assume outro estatuto, o das experimentações das linguagens, que são levadas para outros limiares e o da significação mesma, uma questão filosófica, felizmente sem respostas prontas e acabadas e que têm feito a delícia das polêmicas, provocações e rupturas.

Nada mais falso que "assemblages" de bonecos de barro. Isto se sustenta nestas vitrines de decoração e supérfluo, que acontecem uma vez por ano, para gáudio de decoradores e "peruas".

Não se trata de dar receitas ou encontrar soluções; mas Espedito Seleiro, "designer" do couro, com sua oficina em Nova Olinda, com a criação de peças para as grifes Cavalera e Triton, faz o percurso inverso e é aceito porque tem competência e talento e não porque é exótico.

A família Cândido, que vive e atua em Juazeiro do Norte, parece ter encontrado na modelagem em barro das cenas, "temas" do cotidiano do Cariri, uma síntese, um ponto de equilíbrio entre criação e encomenda, entre tradição e contemporaneidade, atingindo uma aceitação pelo mercado que não implica em perda da força do ofício ou diluição de seus próprios fazeres.

Os Irmãos Aniceto, banda cabaçal do Crato, aliando música e performance (conceito tão caro a Paul Zumthor), parecem "eternos" diante da performance dos mitos Cariri e "clássicos" quando se discute mais uma vez a velha questão do popular um contexto em que a ênfase deveria ser dada à tradição.

Na outra mão desta vertente, os exemplos são poucos. A tradição é rejeitada e é bom que isto aconteça, na maioria das vezes. Não se pode cair na folclorização da arte. Até mesmo o artesanato precisa de um sopro renovador, que não se faz com os "modelos" da Ceart (Centro de Artesanato do Ceará), mas quando o próprio artista sente a necessidade da superação e tenta responder às cobranças e às exigências do mercado.

O "mangue-beat", movimento que agitou a cena cultural pernambucana fez isso bem, mas não se pode fazer isso indefinidamente. Esgotou-se a "fusão", o estranhamento se tornou redundância e acabou aqui num pretenso movimento cabaçal.

O cearense Efrain Almeida, radicado no Rio de Janeiro, retomou os ex-votos de Zé Tarcísio e Aderson e fez uma nova leitura, em tempos de delicadeza e agressão. Apontavam para endemias que falavam em grupos de risco e antecipavam, o apocalipse. Herbert Rolim também circulou pelo terreno das memórias. Stênio Burgos vai em busca de um sertão encantado e de um litoral ameaçado e faz uma grande pintura, com uma força surpreendente.

João Pedro do Juazeiro se supera na escavação de grandes pranchas de madeira industrializada para cortar suas xilogravuras que ganham cores e causam forte impacto.

Bordado

Tudo isso leva a uma viagem de volta aos cangaceiros de Aldemir Martins, aos bonecos de sucata de Zé Pinto e às festas do Nogueira.

Mas a grande referência desta relação entre o artesanal e a chamada "alta cultura" serão os bordados de Leonilson. Aqui, a tradição cearense do artesanato e da habilidade, construída desde os aldeamentos indígenas, explode com força, lirismo e contundência.

Os bordados, que dialogam, com as propostas artesanais de Artur Bispo do Rosário, como o manto que usaria para estar diante de Deus, são a mais perfeita tradução destes saberes e fazeres deslocados para um contexto de dor, onde a agonia ganha o estatuto de obra de arte, não pela morbidez, mas pela possibilidade de significar mais do que sugere a nossa vã filosofia.

Leonilson borda a impossibilidade, como uma Penélope que espera pelo mistério e olha para o infinito. Seu bordado não é desfeito, antes nos enreda nestes fios e nestas tramas de cumplicidade e sedução.

Ainda é cedo para saber o que tem sido feito no campo do vídeo-arte, da instalação e de outras propostas contemporâneas. Talvez os artistas jovens tenham uma extrema urgência, talvez o mal-estar porque sabem que viverão de editais e terão muitas dificuldades de acesso ao mercado ou talvez porque seja da essência da arte não ser compreendida e aceita no instante em que é feita.

Um excessivo narcisismo faz com que a proposta seja associada a fogo e ferro ao artista, preocupado com o próprio umbigo e querendo ser o criador, o curador, o galerista e até mesmo o comprador, leva a uma excessiva fragmentação e a uma impossibilidade de compreensão do que está sendo dito (ou não dito).

Vale pensar nos grafites de hoje como possíveis pontos de partida para nossa perplexidade diante da exclusão de parte da juventude do mercado de trabalho. Cifrados, eles significam pouco diante do que poderiam representar. Basquiat, Alex Valauri e Weaver Lima.

Talvez seja o momento de questionar a prevalência de um modelo. Se vivemos tempos de diversidade cultural por que a insistência no envelhecimento dos suportes tradicionais? Por que a instalação precisa matar a pintura, o desenho, a gravura e a escultura?

Se a pluralidade é a palavra-chave e politicamente correta de hoje em dia, talvez seja a hora de aceitar o que venha marcado pela sinceridade, pela consistência de uma proposta e pela seriedade de um percurso.

Tradição e contemporaneidade não são antagônicas, tampouco duas faces de uma mesma moeda. Parecem mais possibilidades de se olhar o mundo de modo mais rico, mais aberto e menos dogmático.

GILMAR DE CARVALHO*
ESPECIAL PARA O CADERNO 3

*Gilmar de Carvalho é jornalista, professor da UFC e autor de livros como "Artes da tradição" e "Mestres Santeiros"

Utopia da educação 4

Queridos e queridas,

Recebi mais um texto da turma de Filosofia da educação, do curso de Letras: para ler e pensar...


Terra dos contrários.

Gabriel Seif

Estive passeando por muitos lugares, e conheci tanta coisa por esse mundo que ficaria anos aqui tentando explicá-las sem conseguir alcançar uma descritiva honrosa.

Entretanto o lugar que mais me impressionou, e não poderia deixar de tecer algum comentário.

A Terra dos Contrários – é este o nome - praticamente igual ao mundo que estamos acostumados, com algum detalhe diferente. Essa terra tem problemas assim como temos aqui, mas lá eles são chamados de soluções.

As pessoas não pensam em sexo, e podem passar horas conversando e sonhando em encontrar o Amor. O casamento só acontece uma vez na vida. Lá as pessoas ganham dinheiro pra trabalhar e algumas pessoas andam pelas ruas para entregar carros, carteiras, dinheiro e jóias para outras pessoas, e são conhecidas pelo nome de “marginais”. Os “participantes de grupos de apoio” são economistas que ajudam pessoas com algum vício. As instituições de detenção servem para instruir as pessoas que lá ficam por certo tempo, além de banir a ação criminosa dessa terra. A polícia é formada pelos melhores cidadãos dessa terra, já que a proteção e garantia do cumprimento da lei é obrigação de todos os habitantes.

As pessoas são divididas em grupos individuais por características coletivas, e os “emos” são as pessoas que mais fazem piada e dão risada, assemelhando-se aos nossos palhaços.

Na Terra dos Contrários ninguém acredita em heróis, e a esperança morre muito cedo. Eles sempre enxergam a realidade, e aqueles que mantém essa esperança são os políticos vocacionados.

Na Terra dos contrários a música é usada no diálogo e a conversa é a melhor animação de uma festa. Lá os animais são irracionais e os homens usam a inteligência.

Na Terra dos contrários, em casa de ferro o espeto é de ouro.

Na Terra dos contrários, as pessoas se amam como se não houvesse amanhã, pois na verdade amanhã existe e será muito melhor se nos amarmos.

Na Terra dos contrários, nada acaba em pizza.

Na Terra dos contrários não existe conto de fadas.

Na Terra dos contrários existe final feliz. Mas todo final feliz tem uma história!

Acerca da Educação

Precisei retornar à Terra dos Contrários, pois me pediram para criar um modelo de educação. Qual lugar seria mais interessante para observar modelo de qualquer coisa do que a já conhecida, por mim, Terra dos Contrários? Dessa maneira visitei aquele lugar por mais uma vez para verificar a maneira de organização e funcionamento – parte mais importante – da educação.

Assim que cheguei já notei uma mudança. Mas nessa terra, uma mudança de organização está ligada ao todo. Então a organização do todo é motivo e auxílio de cada particularidade. A ordem está presente na formação do indivíduo, assim como o lazer. E o lazer parece muito mais interessante pela existência das ordens. Foi-me dito que por essa ordem, todos os habitantes em todas as idades têm direito a este lazer, então ninguém busca nenhum refúgio parecido com drogas ou outros vícios autodestrutivos. Tive que observar isto por minha conta, pois ninguém sabia o que era a “droga” quando lhes perguntava, além de ter sido confundida com medicamentos por quase todos os perguntados.

Visitei a escola do país, e fui muito bem recebido. Havia um local para refeições e lá estavam professores e alunos em uma aula de alimentação. Continuei meu caminho para outras salas de aula. Não havia anotações informativas sobre qual sala era qual. Percebi então que as salas eram divididas entre as idades. Com uma pesquisa mais aprofundada percebi a existência de uma escola por bairro, e estes eram divididos em espaços iguais. Assim as escolas tinham mesma maneira de organização em todos os lugares naquela terra.

Os alunos ingressavam sem processo seletivo, e desde pequenos entravam na escola com o objetivo de aprender. Aliás, era esta a matéria do primeiro ano: como aprender.

Depois do quinto ano, os professores recebiam lição de casa dos alunos, para responder dúvidas e atingir os pontos de mais dificuldade dos alunos. Não havia reforço. Ninguém tinha problema de faltas. Quando um faltava, outro companheiro de sala já transmitia o que havia aprendido ao aluno faltante. O conteúdo era explicado em teoria e demonstrado em prática, assim, nenhum aluno se perguntava “para quê serve isto?”.

Aproximei-me de um professor e perguntei sobre o método de avaliação. Este professor me pediu para acompanhá-lo, e dirigiu-me ao distrito policial da Terra dos Contrários. Ele prestou queixa de distúrbio da ordem, e fomos presos. Ele e eu.

Passamos o final daquele dia e mais uma noite inteira na cadeia. Lá pudemos conversar sobre tudo, e lho fiz as perguntas que recordava. Ele me explicou que a organização, ou secretaria, das escolas eram muito organizadas, e ligadas às instituições penais. As pessoas que cometiam algum crime cumpriam pena, e durante o primeiro e último dias desta pena, o professor deste indivíduo passaria uma noite com o detido.

Ele também me explicou que o decreto nas escolas era o ensino e o aprendizado efetivo. Não havia motivo na avaliação de conhecimento dos alunos, pois o interesse era deles. Da mesma maneira, não havia motivo na avaliação de conhecimento dos professores, pois não era motivo de orgulho ser um professor com longa ficha criminal. Ao sermos liberados, decidi por não perguntar sobre minha acusação, por mais absurda que tivesse achado. Hoje penso que absurdo é não ser assim.